Com o agronegócio da soja no Serrado rico fica mais rico e pobre mais pobre
Estudo
aponta concentração de renda e terras como efeitos da produção de commodities
no Cerrado
Relatório do
Greenpeace mostra que 58% dos municípios do Matopiba continuam pobres, com
produção e qualidade de vida piores do que a média de seus estados
Estudo inédito apoiado pelo
Greenpeace sobre as dinâmicas socioeconômicas na região de Cerrado denominada
Matopiba mostra que municípios campeões na produção de soja na região não tem
indicadores de desenvolvimento social condizentes com a riqueza que produzem na
balança comercial.
Segundo o relatório “Segure a Linha: A Expansão do Agronegócio e a Disputa pelo
Cerrado”, somente em 45 dos 337 municípios do Matopiba, que engloba os
estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, os indicadores de produção e de
bem-estar superam a média dos respectivos estados. A grande maioria está na
situação oposta: 196 municípios continuam pobres, com produção e qualidade de
vida piores do que a média de seus estados.
“O estudo mostra que há
muito mais pobreza e desigualdade do que riqueza e bem estar nesta região que é
apresentada como modelo de sucesso pelo agronegócio”, afirma o autor do estudo,
o Sociólogo e Doutor em Ciência Ambiental, Prof. Arilson Favareto, da
Universidade Federal do ABC. Para o estudo, foram percorridos mais de 7 mil
quilômetros nos quatro estados da região e realizadas cerca de 150 entrevistas
com atores de diferentes segmentos. Foram analisados, ainda, dados públicos
sobre a produção e comércio de commodities e indicadores socioeconômicos
oficiais.
Dos 10 municípios campeões
na produção de soja no Matopiba, apenas três estão no grupo com bons
indicadores sociais, classificados como municípios “ricos”, onde há grande
produção e bons indicadores sociais. Na outra ponta estão os municípios
classificados como “injustos”, que totalizam 67 dos 337 municípios que compõem
o Matopiba, onde, mesmo com alta produção de grãos, os indicadores sociais,
como mortalidade infantil, acesso a educação, saúde e nível de renda, estão bem
abaixo da média dos estado.
“O estudo também mostra que,
mesmo nas cidades com bons índices sociais, as principais melhorias nas
localidades não partem da iniciativa privada do setor, mas sim do próprio
Estado, no processo de garantir financiamento e infraestrutura para que o
negócio de commodities tenha competitividade para levar lucro a seus
investidores, e não para o desenvolvimento local. Nas regiões onde a soja
desponta, a concentração de renda e a pouca geração de emprego se aprofundam.
Na prática, isso é a negação do ‘Agro é Pop’ que o setor tenta martelar para a
sociedade", explica Adriana Charoux, da campanha Amazônia do Greenpeace
Brasil.
Segundo o estudo, 60% da
renda gerada no Matopiba fica concentrada em 0,4% das fazendas produtoras,
enquanto 80% das fazendas ficam com apenas 5% da riqueza produzida na região.
Sobre a geração de empregos, ao se considerar exclusivamente o emprego formal,
não é na agropecuária que se concentram os vínculos. Quem prevalece é o setor
de serviços, que concentrou 67,9% dos empregos, em média, nos municípios em
2014. Ou seja, os trabalhos temporários ou informais são os que prevalecem no
setor agropecuário. E os formais, diretamente relacionados ao setor, raramente
empregam mão de obra local, uma vez que requerem qualificação muito específica
para seu desempenho.
Outro agravante é que, de acordo com o Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais - INPE, entre 2013 e 2015 foram subtraídos 36.900 km² da
cobertura vegetal do Cerrado, boa parte no Matopiba. “É uma conta que não
fecha. O desmatamento não pode ser visto como um custo inerente ao desenvolvimento
quando, na verdade, toda a comunidade científica mundial vem alertando que é
justamente o contrário. É a manutenção de nossa vegetação nativa que assegura o
equilíbrio climático fundamental para garantir não apenas a segurança da
humanidade, mas a sobrevivência do próprio agronegócio brasileiro.”, observa
Charoux. "A produção com desmatamento faz com que o Brasil perca
competitividade, ameaçando a geração de empregos".
Não se trata de dizer que
tudo de ruim se deve ao agronegócio, mas de chamar atenção para o fato do
Brasil ser tão dependente de um setor que cobra tamanho custo ambiental. Os
resultados do estudo chegam em um momento crítico para o Brasil, onde o País
volta a questionar o valor da preservação dos recursos naturais em oposição a
um suposto ganho econômico de curto prazo proporcionado pela manutenção de um
modelo de desenvolvimento pouco diverso e extremamente excludente.
Comentários
Postar um comentário